Oi, sumidos.
Fazer aniversário é meio como atualizar o software: ninguém sabe exatamente o que mudou, mas tá todo mundo esperando que você funcione melhor.
Eu, por exemplo, não tenho certeza se sou a versão nova de mim mesma ou só instalei um wallpaper mais bonito pra disfarçar os bugs antigos.
Se bem que, sem falsa modéstia, tenho dado um duro tremendo nessa tarefa, às vezes árdua, que é evoluir. E vou dizer pra vocês: tanto eu quanto os sortudos que convivem comigo, dizem que tô mandando bem nisso.
Meu pai, carioca e contador de causos com sotaque, sempre dizia que eu nasci na noite mais fria do ano. São João. A cidade dormia encolhida, e eu fazia minha entrada no mundo com toda a contradição possível: canceriana nascida sob geada, regida pela lua e com alma de fogueira.
O gosto pelas festas juninas, ele explicava, vinha da nossa história — da família dele, com raízes em Pernambuco. Meus avós paternos sabiam que São João não era apenas um santo, mas um verdadeiro regente de festas: o padroeiro das bandeirolas, do forró, da pamonha e da quadrilha ensaiada no quintal. Lá, o mês de junho é quase sagrado. E a fogueira, mais que calor, é saudade acesa.
São João Batista — o do meu dia — é também um personagem curioso: nasceu pra anunciar outro nascimento. Batizou nas águas, viveu entre o deserto e o rio. Um santo de extremos, feito pra quem veio ao mundo com um pé na introspecção e outro na festa. Me identifico.
E como se tudo isso já não fosse suficientemente simbólico, tem mais: o dia de São João coincide com o solstício de inverno aqui no hemisfério sul. É a noite mais longa do ano. Um escuro que dura, uma espera que exige fé. As culturas europeias, muito antes dos balões e bandeirinhas, já acendiam fogueiras no Yule — celebração ancestral do retorno do sol. Se celebrava a promessa: a luz vai voltar.
Eu acho lindo isso: nascer no ponto mais escuro do calendário, mas já com o instinto de procurar o fogo. Talvez por isso eu seja assim — uma mistura de reclusão e coragem, de introspecção canceriana com alegria herdada. Esse ano, ao contrário dos anteriores, eu não quis fazer balanço nem drama. Já não dou importância pra coisas que já dei e adquiri uma maneira mais racional de enxergar a vida.
Esse ano eu só aceitei.
Aceitei que a vida me mudou sem me pedir permissão. E, curiosamente, mudou pra melhor. Com algum grau de delicadeza, bastante de afeto genuíno, e uma ou outra crise, é verdade, mas ainda assim: melhor
Talvez seja isso que chamam de maturidade: um cansaço somado a uma esperança teimosa.
Ou uma fé prática, que acorda cedo, lava a louça e escreve porque gosta, não porque precisa provar algo.
Tenho passado mais tempo no consultório do que nas redes, ouvindo histórias que não são minhas. Tem dias em que eu saio de lá com a impressão de que todos nós estamos tentando amar sem fazer bagunça.
Outros dias, só tentando não sumir.
Esse ano, troquei a ideia de festa por cozinhar em casa pra poucas pessoas.
O número de convidados diminui, mas o silêncio confortável depois da sobremesa tem me parecido um presente maior do que qualquer reunião barulhenta.
Essa newsletter é meu jeito de dizer que que eu gosto de escrever pra quem me lê.
E que crescer é mais bonito do que eu esperava.
Pra celebrar, fiz uma playlist literária de aniversário, que não é propriamente festiva, mas é uma seleção das melhores músicas (na minha opinião) dos meus três livros. Da 1 até a 4, são de “Cinco histórias de amor”, da 5 até a 8, são de “Era uma vez uma chave” a 9 e a 10 são de “O Segredo de Lady Bush”. Agora, as duas últimas, a 11 e a 12 são do próximo livro, que tá no forno e eu não vou contar nada sobre ele, além de que é de amor e tem músicas lindinhas. Clica aqui : Trilha da vida escrevível🎧📚.
Escutem, amem, aproveitem!
Te lembra:
o único crime cometido aqui é amar demais o leitor que lê até o fim.
Com carinho,
Andrea
"Eu acho lindo isso: nascer no ponto mais escuro do calendário, mas já com o instinto de procurar o fogo." -- que ideia linda, que jeito lindo de ver a vida! Feliz aniversário, amiga! Que seja o começo de um ciclo muito especial 💜
Parabéns Andrea, teu estilo nos transporta com leveza para teu ideário singular e incrível, nascentes em noite fria e realmente você aquece nosso coração ❤️